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13 de Setembro de 1987 - Passados 23 Anos

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13 de setembro de 1987 era um Domingo, durante aquele dia (de tarde) Wagner (Caminhoneiro) e Roberto (Reciclava lanternas de automóveis), ambos desempregados, estavam recolhendo sucatas e materiais recicláveis em Goiânia como forma de conseguir alguma renda. Em pleno centro da cidade os mesmos se depararam com uma ruína (Foto abaixo).


Lá dentro encontraram um aparelho de abandonado (Foto abaixo) com estrutura de metal e chumbo que foi recolhido em um carrinho de mão e...


...levado para a Rua 57 nº. 68 no Setor Central, naquele número moravam muitas famílias, era um lote com barracões para alugueis, mais ou menos 12 crianças com seus pais, ali o cilindro de chumbo e metal foi violado e o lacre que protegia a cápsula de Césio 137 fora rompido. O estranho e desconhecido objeto ficou ali debaixo de uma mangueira em cima de um velho tapete.

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3 Minutos de Silêncio & Sensibilidade

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Ano 2003.
Roteiro e Direção: Ângelo Lima
Fotografia: Raimundo Alves e Duane
Edição: Aline Nóbrega.



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Césio 137 - Vídeo Reportagem

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Rejeitos radioativos em Abadia de Goiás.

ATENÇÃO. NENHUM FILME A BAIXO DEVE SER CONSIDERADO COMO FONTE ÚNICA DE INFORMAÇÃO!!! 







Outros vídeos e documentários -> AQUI

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As Celebrações, A Memória Traumática & Os Rituais de Aniversário

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Os dados usados neste texto fazem parte do arquivo pessoal da autora e foram coletados com o apoio de financiamento da Wenner-Gren Foundation for Anthropological Research (Grant n. 5969; 7046). 

Telma Camargo da Silva
Doutora em Antropologia. Autora da tese: Radiation Illness Representation and Experience: The Aftermath of the Goiânia Radiological Disaster. City University of New York, 2002.

– Hoje é dia da Mãe! – disse José. Na cabeceira da mesa, a toalha manchada de Coca-Cola, o bolo desabado, ela era a mãe. A aniversariante piscou. (...) Como pudera ela dar à luz aqueles seres risonhos, fracos, sem autoridade? O rancor roncava no seu peito vazio. (...) Olhou-os com sua cólera de velha. Pareciam ratos se acotovelando, a sua família. Incoercível, virou a cabeça e com força insuspeita cuspiu no chão.
Clarice LispectorFeliz Aniversário!


Os eventos que aconteceram em Goiânia e marcaram o mês de setembro de 1987 como o tempo físico do “maior desastre radiológico do mundo” sugerem que, em 2007, se anunciem os vinte anos do desastre. Mas o que significa esta passagem do tempo para os diferentes atores sociais do desastre? Quer dizer, a narrativa do aniversário é a mesma, entre outros, para os radioacidentados, para os estudiosos do tema, para os profissionais que trabalharam na contenção da radiação e na purificação dos espaços e dos corpos contaminados, para as organizações governamentais responsáveis pelo gerenciamento da catástrofe, para as ONGs? No caso de Anita, a avó do conto de Clarice Lispector, o tempo físico – 89 anos – é apropriado pelas diferentes significações que a ele atribuem a amiga, os familiares e a própria avó. Para os filhos, para a filha, para a viúva do filho predileto, o aniversário da avó se constitui em um encontro ritualístico que se renova a cada ano e que desnuda as múltiplas relações familiares que vão se constituindo e/ou se desfazendo ao longo do tempo. Para Anita, viver com 89 anos significa entender a invisibilidade, a dependência física e vivenciar “aquela angústia muda, de contemplação impotente” face à passagem de mais um aniversário.

O tempo físico, marcado na nossa cultura pelo calendário gregoriano, definido no século XVI, é sempre modelado pelo tempo social. Logo, as celebrações são significadas, entendidas e vividas num ritmo outro, assinalado, por exemplo, por espaços temporais de cinco anos, uma dezena de anos, vinte anos... O ritual das celebrações é engendrado, pois, por um tempo cíclico definido segundo os sentidos que a elas querem atribuir os guardiães de memória. Assim, as lembranças e o tempo apropriado para lembrar o passado descortinam, no presente, o campo de forças em que diferentes atores sociais disputam a representação dos eventos passados. Se, pois, a contagem do tempo é essencial para a produção de significações, para o entendimento de rituais que pela própria definição se processam em uma temporalidade repetitiva, falar de sobre aniversários é uma forma de entender as representações da vida social. O que dizer então dos sentidos construídos ao longo dos anos sobre a marcação do tempo do desastre radioativo de Goiânia?

Na maioria das vezes, a palavra “aniversário” é usada nas narrativas tecidas em torno de eventos festivos que celebram nascimentos, casamentos, formaturas. Outras vezes, aparece em anúncios de jornais indicando o “aniversário de morte” de um ente querido. Em ambos os casos, pode-se falar que essas celebrações remetem a uma temporalidade marcada por eventos pertencentes a ritos de passagem. O tempo cíclico assinala, nesses casos, transições de vida, de renascimentos, de mudanças e traduzem o pertencimento a uma identidade social ou a uma relação social que se escolhe conscientemente reverenciar e cuja memória se atualiza através do desempenho ritualístico. Como se processam então estes aniversários, estas celebrações, quando o evento motivador é um desastre e a ele se associa a memória traumática?

Nesses casos, a perspectiva antropológica assinala que o evento traumático só passa a ser ritualizado coletivamente pelas “comunidades de memória” quando se processa a passagem da experiência da catástrofe para a experiência da redenção (Turner, 1982). Ou seja, uma comunidade só escolhe datar um desastre e celebrar o seu pertencimento a esse evento, celebrando o seu aniversário, quando ela consegue associar as noções de superação e de sobrevivência às experiências vivenciadas na catástrofe.

As populações de cidades costeiras da Carolina do Norte e do Sul, nos Estados Unidos, devastadas pelo furacão Hugo, em 1989, participaram de vários rituais de celebração no primeiro aniversário do desastre. Estas comunidades organizaram um festival intitulado Remember Hugo Festivals, promoveram festas para agradecer aqueles que ajudaram a limpar a cidade, realizaram uma competição de malabarismo, uma vigília à luz de velas em frente ao Palácio da Justiça e uma festa à fantasia, onde os convidados deviam se vestir como estavam na noite e na manhã do desastre, portando os objetos usados no cotidiano vivenciado após a passagem do Hugo. Nesse caso, as observações de Forrest (1993) indicam que a celebração de pertencimento ao Hugo, e por isto a comemoração do aniversário, só foi possível porque as vítimas estabeleceram fortes laços sociais e emocionais no processo de superação do desastre. Os moradores das cidades criaram vínculos de confiança, compartilharam coragem no enfrentamento das adversidades e sentiram orgulho por terem reconstruído as cidades e suas vidas. Estas experiências compartilhadas engendraram uma nova comunidade de pertencimento definindo limites entre os habitantes dessas comunidades e os residentes das cidades vizinhas; entre os moradores que vivenciaram o desastre e os habitantes dessas cidades que se encontravam em viagem. É pois essa comunidade criada na vivência e superação do Furacão Hugo que festeja o aniversário do desastre.

A experiência do Holocausto, denominada em hebraico shoah, a exemplo do furacão Hugo, é ressignificada pelos sobreviventes do massacre de judeus europeus pelo nazismo e constituem também uma comunidade construída na vivência da tragédia. A memória traumática decorrente dos campos de concentração, das câmaras de gás e do exílio passam a integrar o ritmo e os rituais da vida pública dos judeus. Essa lembrança é atualizada em termos de rituais de comemoração, estabelecimento de monumentos públicos e privados e de re-elaborações artísticas e literárias do evento. Nesse caso, a experiência da catástrofe se transforma em experiência de redenção com a criação do Estado de Israel, em 1948. O rito de passagem se efetiva na mudança da condição de judeu em exílio para aquela engendrada pelo pertencimento ao Estado-Nação. Os rituais comemorativos e os lugares de memória se instituem como uma metáfora da comemoração da vida (Friedlander e Seligman, 1994). Aqui, os lugares e as datas comemorativas do Shoah interligam a catástrofe aos aspectos de superação representados pelo estabelecimento do Estado-Nação e assim o desastre é celebrado ritualisticamente.

Os aniversários de desastre seguem, em sua maioria, o padrão de quaisquer outros aniversários. Alguns estudiosos afirmam que o primeiro aniversário é o mais significativo porque os fatos vivenciados ainda estão muito vivos nas experiências cotidianas (Birtchnell, 1986 apud Forrest, 1993: 448). Depois, as lembranças submergem e reaparecem no período convencional de cinco anos e na seqüência, no ritmo de dez anos, vinte anos... No caso de Goiânia, os rituais relativos aos aniversários do desastre radioativo obedecem também este tempo cíclico. O primeiro aniversário do desastre é celebrado por uma missa na Paróquia de Santo Antônio, no Setor Pedro Ludovico, com a presença dos radioacidentados; por uma mesa-redonda na Universidade Federal de Goiás intitulada Césio 137 – Um Ano Depois; por um encontro de saúde, a II Maratona Goiana de Terapias Alternativas com o tema Alternativas para Goiânia depois do Césio 137 e pelo I Simpósio Internacional sobre o Acidente Radioativo com o Césio 137 intitulado Acidente radioativo de Goiânia – um ano depois, coordenado pela Fundação Leide das Neves Ferreira, uma instituição do governo do Estado de Goiás, criada em 1988 para dar assistência às vítimas e realizar pesquisas sobre os efeitos nos humanos da contaminação com o césio 137 e da exposição à radiação. O nome foi escolhido em homenagem à criança de seis anos, uma das primeiras vítimas fatais do desastre.

Em 1992, na manifestação dos cinco anos, os membros da Associação das Vítimas do Césio 137 com o apoio de entidades solidárias como a Universidade Católica de Goiás, organizaram uma manifestação na Feria Hippie, então localizada no centro de Goiânia, e na feira da Praça do Sol, no Setor Oeste, intitulada Goiânia Alegria! onde distribuíram uma carta-manifesto para protestar contra o descaso e a lentidão do governo no atendimento à população atingida pelo desastre. Nesse documento eles afirmaram: “A população de Goiânia precisa estar alerta! O acidente com o césio 137 não acabou!” (Diário da Manhã, 13 de setembro de 1992). Para os habitantes da cidade diretamente atingidos pela catástrofe, o desastre continuava na medida em que se sentiam estigmatizados, enquanto os seus problemas de saúde não recebiam a devida atenção dos órgãos governamentais e os valores das pensões não eram atualizados. Os cinco anos do desastre foram também marcados por celebrações artísticas. O fotógrafo Nelson Santos organizou uma mostra intitulada Ecos de uma tragédia e artistas plásticos, entre os quais Antunes Arantes, realizaram uma performance no terreno onde ficava o Instituto Goiano de Radioterapia como sinal de alerta aos perigos da radiação.

No ciclo ritualístico dos aniversários do desastre com o césio 137, 1997 marcou o ano das celebrações dos dez anos e o desnudar das significações conflitantes processadas em torno das memórias da tragédia (Silva, 2005). Por um lado, as instituições governamentais promoveram dois eventos com repercussões internacionais: o primeiro foi a inauguração do Depósito Definitivo de Rejeitos Radioativos e do Centro Regional de Ciências Nucleares do Centro-Oeste, no então Parque Estadual de Abadia de Goiás; e o segundo, a realização da conferência internacional O Acidente Radiológico com o Césio 137: Goiânia Dez Anos DepoisNessas celebrações, o sentido atribuído tanto pelas performances como pelas narrativas construídas sobre os fatos de 1987 era de que o ano de 1997 representava “uma página virada na história do desastre” e de que “tudo estava sob controle”. Os rejeitos radioativos, que por dez anos ficaram a céu aberto, estavam agora acomodados definitivamente e a Comissão Nacional de Energia Nuclear assumia o compromisso de monitorar o local por mais cinqüenta anos, ou seja, até 2047. Os efeitos da radiação sobre os indivíduos atingidos estavam sob controle do conhecimento científico e o número das pessoas atingidas contido pelos parâmetros da biomedicina e pelo saber da medicina nuclear.

Por outro lado, outras narrativas mediam o tempo do desastre como um ritual que repetia uma celebração de perda, de sofrimento e de medo. O artista plástico Siron Franco, que, em 1987, produzira a série Césio (aqui parcialmente reproduzida), considerada por ele a “reportagem visual do acidente” pintou, dez anos depois, a tela intitulada Quinta Vítima (Jornal O Popular, 28 de setembro de 1997)Esta manifestação artística pode ser lida como um ato performativo do sentimento de que a idéia da morte continuava presente em 1997. Uma pesquisa quantitativa encomendada pelo jornal O Popular revelou que 53,6% dos goianienses entrevistados acreditavam na possibilidade de o acidente causar algum tipo de risco à população. A manchete do caderno especial desse mesmo diário, intitulado Césio 10 anos depois, foi “O medo ainda não acabou”. Os vizinhos das casas contaminadas organizaram no lote concretado da Rua 57, do então Bairro Popular, uma celebração de luto que denominaram de O Forró do Césio. Para eles, esta era uma forma de protesto para marcar o drama vivido pelos indivíduos atingidos pelo desastre.

Os dez anos também marcaram a emergência de vozes que reivindicavam uma relação causal entre identidade profissional e doença, como o caso dos policiais militares que trabalharam na contenção do desastre radioativo e lutavam pelo reconhecimento como vítimas (Silva, 1998). Para os radioacidentados, a memória estava inscrita nos corpos, nas dores e no estigma que vivenciavam em seus cotidianos, como expressam as palavras de Ivo Alves Ferreira: “Não conseguimos esquecer. Quando não é a pele, que ficou marcada, são as pessoas (que nos marcam)” (Jornal Opção, 14 a 20 de setembro de 1997). É essa idéia da memória corporificada, atualizada na experiência do presente das pessoas impactadas pelo desastre, que aparece nas manchetes de jornais que noticiaram os dez anos do desastre: “Césio 137: 10 anos de sofrimento” (Top News); “Césio ainda é ferida aberta em Goiás” (Jornal do Brasil); “Um drama que não acaba” (Jornal do Brasil). Para estes atores sociais, as celebrações dos dez anos indicavam a perspectiva de um aniversário com a atualização no presente das marcas que ficaram nos corpos e do trauma que se insere nos atos do cotidiano. Para os outros, o tempo ritualístico é o do aniversário do evento circunscrito no passado.

No caso de Goiânia, a experiência da catástrofe não se transformou em uma experiência de redenção. A dúvida de que Goiânia esteja mesmo livre da radiação; a falta de confiança nos agentes responsáveis pelo trabalho de descontaminação realizado na fase emergencial, entendida como 1987-1988; o medo de que os radioacidentados possam ainda conter o césio 137 em seus corpos; a falta de assistência à saúde das vítimas; a contínua luta de grupos sociais que se consideram atingidos pelo desastre e não foram reconhecidos pelos órgãos governamentais – como os trabalhadores do Consórcio Rodoviário Intermunicipal S.A. que atuaram no transporte dos rejeitos radioativos de Goiânia até o depósito provisório de Abadia – permeiam as narrativas construídas em 2007 e atualizam o desastre. Estas múltiplas vozes apontam para a existência de uma memória traumática que tece as comemorações e caracteriza parte dos rituais de Goiânia como “aniversário com o desastre”. Neste caso, as vítimas e a população afetada pela catástrofe não engendraram uma comunidade de superação e o rito de passagem não se efetivou. O renascimento do contexto de morte trazido pelo desastre não aconteceu. Isto diferencia fundamentalmente as comemorações de aniversário no caso do desastre radioativo das celebrações de outros desastres.

Como os familiares da festa de aniversário de Anita, a avó do conto de Clarice Lispector, os participantes do “aniversário do desastre” retornam simbolicamente para suas moradas. Contudo, aqueles cujos rituais apontam para o aniversário com desastre, ficam como a avó ouvindo a frase “Até o ano que vem!”, quando as condições de sua existência seriam mais uma vez lembradas e comemoradas mas não modificadas. Um trecho da carta-manifesto, intitulada Três anos de agonia e dor, e divulgada pela Associação das Vítimas do Césio 137, em 1990, no terceiro “aniversário com desastre” ilustra minha analogia:

Cansados e desanimados de contar a mesma história todos os dias para pessoas que curiosamente escutam nossos apelos e depois desaparecem deixando as promessas que jamais foram cumpridas, e o tormento continua. (...) 
Como estarão estas vítimas hoje?
Estamos vivos!... ainda.

Talvez para que o ritual de passagem se efetive e se constitua uma comunidade de redenção no caso do desastre de Goiânia, os sobreviventes precisem, assim como Anita em sua festa de 89 anos, cuspir metaforicamente as suas angústias, cacarejar um riso frouxo e despertar de sua mudez. Talvez, assim, quem sabe, a festa de aniversário dos vinte anos do desastre provoque uma escuta das narrativas que há vinte anos os aniversariantes insistem em contar e tornar audíveis.


Referências
FORREST, Thomas R. “Disaster Anniversary: A social reconstruction of time”. Sociological inquiry, Vol. 63, no 4, Nov. 1993, p. 444-456. FRIEDLANDER, Saul; SELIGMAN, Adam B. “The Isralei memory of the Shoah: on symbols, rituals, and ideological polarization”. In: FRIEDLANDER, Roger; BODEN, Deirdre (org.). Space, time and modernity. University of California Press: Los Angeles, 1994, p. 356 – 371.
LISPECTOR, Clarice. “Feliz aniversário”. In: Laços de família. Editora Rocco: Rio de Janeiro. 1998, p. 54. SILVA, Telma Camargo da. “As fronteiras das lembranças: memória corporificada, construção de identidades e purificação simbólica no caso de desastre radioativo”. Vivência, no 28, 2005, p. 57-73. _____. “Soldado é superior ao tempo: Da ordem militar à experiência do corpo como locus de resistência”. Revista Horizontes antropológicos. Número especial: Antropologia do Corpo e da Saúde. Organizado por Ondina Fachel Leal. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Ano 4; no 9, Págs. 119-143. Julho de 1998.
TURNER, Victor. Celebration: studies in festival and rituals. Washington, D.C. Smithsonian. 1982.
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4 de setembro de 1987 - Anunciada uma Bomba Relógio Nuclear

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Na história do Brasil está escrito que em 4 de Setembro de 1987, o então presidente da República, José Sarney, anunciou com pompa que o Brasil dominava a tecnologia nuclear e passava a fazer parte do restrito grupo dos países atômicos. 


(Anos depois o ex-presidente José Sarney e alguns antigos colaboradores do governo confirmaram que nas décadas de 70 e 80 militares e funcionários públicos federais das áreas energéticas e de Informação trabalharam sigilosamente para produzir uma bomba atômica brasileira. Essas confissões deram um selo oficial a informações já conhecidas sobre o famigerado PROGRAMA NUCLEAR PARALELO, sustentado por recursos depositados em contas secretas e responsável por pesquisas e testes para fins bélicos.)


Entretanto foi em Setembro de 1982 que o PROGRAMA NUCLEAR PARALELO logrou sua primeira experiência de enriquecimento de urânio com sucesso. A declaração anterior é do Almirante Othon, antigo coordenador do PROGRAMA NUCLEAR PARALELO, hoje atual presidente da Eletronuclear (A declaração acontece no 05:19 do vídeo a baixo)





Mas infelizmente não foi apenas por esta notícia que nuclear brasileiro foi parar nos jornais do mundo em Setembro de 1987.


Outras mentiras nucleares:



CONTROVÉRSIAS ENVOLVEM ARAMAR 



Quando o projeto de construção do Centro Experimental Aramar foi revelado ao País, na imprensa sorocabana, a Marinha reagiu com um desmentido sobre a finalidade nuclear do empreendimento. 

A Marinha enviou ao Cruzeiro do Sul a seguinte informação, publicada em 1.º de maio de 1985: Não há qualquer intenção em se fabricar artefatos atômicos ou realizar experiências de motores ligados à energia nuclear. Na mesma mensagem, a Marinha atribuiu os comentários a boatos que surgem e adquirem proporções de verdade sem qualquer fundamento real. 

Há 10 anos, em 6 de fevereiro de 1996, o então ministro da Marinha, Mauro Pereira, disse em entrevista coletiva, em Aramar, que a construção do submarino deixara de ser prioridade. A partir de então, segundo Pereira, a Força iria concentrar esforços na construção de submarinos convencionais. Um mês depois, a notícia foi desmentida pelo próprio ministro, que justificou a informação como mal interpretada. 

Além das controvérsias, o programa da Marinha também começou, em 1979, cercado de sigilo. Era a época da ditadura militar, período de autoritarismo e censura. 

Urânio enriquecido 

Entre funcionários civis e militares, Aramar tem hoje 1.243 pessoas, ante cerca de 1.500 em 1988, ano em que a unidade foi inaugurada. A Marinha informa que Aramar continua a enriquecer urânio em seus laboratórios de teste, em equipamentos com capacidade para enriquecer o produto a até 20%. Os equipamentos são máquinas chamadas ultracentrífugas, que geram o nome de ultracentrifugação ao processo de produção.

Por esse processo, o urânio passa de uma máquina para outra, em forma de cascata.
O enriquecimento a 90% seria suficiente para produzir uma bomba atômica. No começo da década de 1990, a Marinha admitiu ter a capacidade de produzir o urânio a esse nível, mas negou qualquer finalidade bélica no seu programa, insistindo no objetivo pacífico - o que respeita dispositivo da Constituição Federal.

A produção de urânio é feita em escala limitada, denominada de demonstração.
Não é divulgada a quantidade produzida por questões de sigilo, segundo o texto enviado pela Marinha.


Fonte: http://www.ipen.br/sitio/?idz=1&idc=1235


O Perigo Concreto adverte: A leitura deste post causa perda imediata de confiança em relação ao Programa Nuclear Brasileiro e esclarecimento das diversas mentiras (antigas e atuais) em relação ao tema.

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Entrevista - Vítimas do Césio 137:A luta dos radioacidentados

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No dia 13 de setembro de 1987, 23 anos atrás, aconteceu um dos maiores acidentes radioativos do mundo, no centro do Brasil, em Goiania. Um velho aparelho de radioterapia com 19 gramas de um elemento altamente radioativo dentro, o Césio 137, virou uma “bomba” atômica – por causa da ignorância dos responsáveis e da falta de educação sobre os riscos da radioatividade em geral.
Até hoje, a maioria das vítimas deste “Chernobyl do Brasil” ainda não foi indenizada nem reconhecida pelas autoridades. Este acidente é uma demonstração clara da importância de informação e educação do povo e de todos os funcionários de hospitais, militares e trabalhadores da construção civil sobre energia nuclear e sobre os grandes riscos da radioatividade. Veja a entrevista de Odesson Alves Ferreira, presidente da Associação das Vítimas do Césio 137 (AVCésio), realizada por Márcia Gomes de Oliveira e Norbert Suchanek, para o Portal EcoDebate.:
O Tribunal de Justiça de Goiás reuniu, em 17 de agosto de 2010, as vítimas do acidente radioativo com o césio-137 para agilizar o andamento dos processos de indenização. Quantas vitimas participaram deste evento?
Odesson Alves Ferreira: Mais ou menos 400 pessoas estiveram presente ao evento. O que as pessoas buscam é o reconhecimento enquanto envolvidas no acidente para que possam receber pensões e assistência médica integral.
Qual resultado criou este evento? O Senhor e a sua Associação estão satisfeitos com o resultado?
Odesson: A grande maioria das solicitações estão nas vias administrativas dos governos estadual e federal. O Tribunal não podia fazer nada. O resultado de ganho com a Audiência é que os cidadãos poderão, a partir de agora, retirar seu processo da esfera administrativa e passar para a judicial e, ai sim, o Tribunal de Justiça na pessoa do seu Presidente, Dr. Paulo Teles, recomendará agilidade nas análises e encaminhamentos dos juízes. Consideramos satisfatório, se levarmos em conta que nos 23 anos pós acidente foi a primeira vez que o Judiciário manifestou preocupação com os radioacidentados.
Concretamente, em 1987, quantas pessoas foram contaminadas em Goiânia?
Odesson: É muito difícil dizer com exatidão o número de contaminados. A Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) diz que monitorou 12.800 pessoas. E que destas, apenas 6.500 apresentaram algum grau de irradiação e somente 249 eram merecedoras de atenção, não relatando que tipo de cuidados elas deveriam receber. No decorrer do tempo, os governos estadual e federal concederam benefícios por vontade política ou administrativa para 468 pessoas.
Nós, da AVCésio e o próprio Ministério Público de Goiás, acreditamos em um número não mais de que 1.600 pessoas tiveram algum contato com objetos ou pessoas altamente contaminadas. E, assim sendo, essas pessoas precisam ser amparadas. Portanto: considerando 1.600 pessoas menos 468, restam 1.132 para serem contempladas. Mas existem cerca de 860 processos em andamentos nas vias judiciais e administrativas.
Quais são os efeitos para a saúde desta contaminação radioativa? Quais são as dores das vítimas? Quais doenças?
Odesson: Não existem doenças específicas da radiação, ocorre sim uma precocidade nos problemas relacionados à saúde, por exemplo: osteoporose, hipertensão, deficiência visual, esquecimento e sérios distúrbios psicológicos e até mentais.
Dentre as muitas doenças que manifestaram estão úlceras digestivas, gastrite, depressão e até alguns tipos de câncer, apesar de que as autoridades não admitem a casualidade entre estas doenças e o acidente. Uma questão muito importante em relação a pergunta sobre as dores das vítimas: As dores são a incerteza, a falta de credibilidade na ciência, pois essa não nos dá resposta quanto aos vários sintomas e nenhum diagnóstico. A falta de confiança no futuro das crianças, algumas nasceram com sequelas e ninguém nos esclarece com clareza, apenas dizem não ter relação com o material radioativo.
Quantas pessoas até agora já morreram por causa deste acidente radioativo?
Odesson: Não podemos precisar quantas mortes por causa do acidente. Posso dizer que 84 pessoas envolvidas faleceram. Destas 20 foram vítimas diretas, mas as autoridades não admitem a causa como sendo o acidente.
Quantas vítimas do Césio 137 o Governo Brasileiro reconhece até hoje? E quantas vitimas já ganharam uma indenização? Qual é o valor desta indenização?
Odesson: Indenização por perdas apenas duas vítimas ganharam. Agora pensões vitalícias são 468 ao valor de R$ 510,00, assim distribuídas: 233 recebem R$ 510,00 do Governo de Goiás e a mesma quantia da União, totalizando R$ 1.020,00. Outras 16 pessoas recebem R$ 822,00 de Goiás e 510.00 da União, num total de R$ 1.332,00. Aqueles que recebem mais foram considerados incapazes para o trabalho.
Contaminados também foram militares por causa do seus trabalhos no acidente do Césio 137. Quantos militares foram contaminados por isso e quantos já ganharam uma indenização?
Odesson: PMs contaminados é impossível dizer, uma vez que eles não foram monitorados pela CNEN na época. 182 militares recebem pensão vitalícia de R$ 510,00 – mais por força política do que por reconhecimento.
Muitos trabalhadores da construção civil também foram envolvidos na limpeza das ruas e casas contaminadas . Eles também são vítimas do Césio 137 por causa da falta de informação e equipamento adequado?
Odesson: As demolições foram realizadas de maneira comum, o transporte dos rejeitos idem, as ruas varridas normalmente e os vizinhos continuaram nas residências, salvo algumas exceções, por isso é que mais de 800 pessoas estão buscando ainda seus direitos. Algumas estão filiadas à AVCésio, apesar de que para nós independe da filiação, desde que nos convença com documentos ou testemunhos válidos seu envolvimento no desastre, brigamos por todos na mesma igualdade.
Existe também a Associação dos Militares Vitimas do Césio 137. A sua Associação está lutando junta com eles?
Odesson: Quanto aos militares temos muito bom relacionamento, alguns deles preferem a AVCésio devido sua credibilidade perante à opinião pública e mídia.
O Senhor soube que na Suíça aconteceu em agosto um evento mundial sobre os riscos da indústria nuclear, com a participação de vítimas desta indústria de vários países do mundo (www.nuclear-risks.org)?
Odesson: Na quarta-feira passada (25 de agosto de 2010) tive um encontro com a Deputada Ute Koczi, do Partido Verde Alemão, e ela disse-me dessa reunião na Suíça, esperamos que tenha bons resultados.
A sua Associação foi convidada para este evento, para falar sobre o acidente de Goiânia, um dos maiores acidentes nucleares na história da humanidade?
Odesson: Não fomos convidados, entendo como muito difícil para nós estarmos participando desses eventos internacionais, não temos verba para despesas. Realmente o desastre daqui foi o maior acidente radioativo em área urbana do mundo, acho que deveriam dar mais visibilidade a ele.
Obrigado pela entrevista!

Márcia Gomes de Oliveira é Socióloga e Professora da FAETEC (Fundação de Apoio à Escola Técnica) no Rio de Janeiro. Durante a UNCED (Rio 92) organizou o Seminário “Amazônia 500 anos de Resistência Indígena e Popular”. Participou do Workshop “Uranium – A Blessing or a Curse?”, em outubro de 2008, na Namíbia.
Norbert Suchanek é Correspondente e Jornalista de Ciência e Ecologia, colaborador e articulista do EcoDebate. Participou do Workshop “Uranium – A Blessing or a Curse?”, em outubro de 2008, na Namíbia.. Participou do Workshop “Uranium – A Blessing or a Curse?”, em outubro de 2008, na Namíbia.
Ambos produziram e realizaram o documentário “Uranium Thirst

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1 de Setembro de 1987 - 23 anos de uma tragédia anunciada.

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Em 1972, o INSTITUTO GOIANO DE RADIOTERAPIA - IGR, então com sede na Avenida Paranaíba, nº 1.587, Setor Central, nesta Capital, devidamente autorizado pela COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR, ESTADO DE GOIÁS - CNEN, adquiriu em São Paulo-SP uma bomba de Césio 137, de fabricação italiana, a fim de utilizá-la na prestação de serviços radiológicos. O terreno em que funcionava o IGR era pertencente à Santa Casa de Misericórdia, que o vendeu ao INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL DO ESTADO DE GOIÁS - IPASGO. Então, pressionado a deixar o aludido local, o IGR transferiu sua sede a outro endereço, terminando por abandonar no antigo prédio a já obsoleta bomba de Césio 137, sem ao menos comunicar o fato à CNEN ou à Secretaria Estadual de Saúde. 

Em 04/05/87, iniciou-se a demolição da construção, a mando do ex-sócio do IGR, AMAURILLO MONTEIRO DE OLIVEIRA, culminando com a destruição quase total do prédio original, que o deixou sem telhado, portas ou janelas, a despeito da existência no local, sem quaisquer avisos ou advertências, da mencionada bomba de Césio 137. 












Fonte: http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=292
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O Programa Nuclear Paralelo

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O ex-presidente José Sarney e alguns antigos colaboradores do governo confirmaram que nas décadas de 70 e 80 militares e funcionários públicos federais das áreas energéticas e de Informação trabalharam sigilosamente para produzir uma bomba atômica brasileira

Essas confissões deram um selo oficial a informações já conhecidas sobre o famigerado PROGRAMA NUCLEAR PARALELO, sustentado por recursos depositados em contas secretas e responsável por pesquisas e testes para fins bélicos.

O que ainda não se tornou público é o fato de o grupo que tramou a inclusão do Brasil na corrida nuclear não estar tão afastado do poder como era de esperar. Rex Nazaré Alves, que ficou conhecido como “o pai da bomba atômica brasileira”, é consultor do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República e foi escalado pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva para ser o representante da sociedade no mais importante colegiado da política nuclear brasileira, no qual são definidos programas, normas e concessões para instalações nucleares no país.

Nazaré Alves tem uma longa trajetória na área nuclear. Em 1969, depois de fazer um curso de doutorado na França, se tornou chefe do Laboratório de Dosimetria da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). Sua ascensão continuou durante o regime militar. Foi nomeado diretor executivo da Área de Segurança Nuclear da Cnen em 1975, e sete anos depois se tornou presidente do órgão.

Abin
O regime militar caiu, mas ele permaneceu no cargo durante todo o governo Sarney (1985-1990), só sendo substituído quando Fernando Collor de Mello (1990-1992) chegou ao poder. No final do governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), virou diretor do Departamento de Tecnologia da Abin. Ocupou o cargo até junho de 2003, já no governo Lula, quando passou a assessor especial da direção-geral da Abin, de onde mais tarde sairia para virar consultor do GSI. Uma portaria de 10 de julho de 2003 nomeou Nazaré Alves para a Comissão Deliberativa da Cnen. “Ele é um patriota, um profissional de qualidade, pesquisador dedicado”, diz Roberto Amaral, então ministro da Ciência e Tecnologia, que assinou a portaria.
A Cnen é o órgão responsável pela fiscalização e produção nuclear no país. A Comissão Deliberativa tem o poder de aprovar ou rejeitar decisões da Cnen e cuida dos investimentos do Fundo Nacional de Energia Nuclear. O colegiado é composto por cinco membros, dos quais quatro são da própria Cnen e um pode ser de for a, o que dá a essa vaga a característica que dentro da área nuclear é definida como de representante da sociedade. É uma função importante, já que é o único olhar externo à Cnen. Na reunião do dia 17 de dezembro de 2004, por exemplo, coube à Comissão Deliberativa analisar cinco licenças referentes ao enriquecimento de urânio na unidade da Indústrias Nucleares do Brasil (INB) em Resende (RJ). Testes sigilosos para enriquecer urânio foram usados pelo Programa Nuclear Paralelo.
Na mesma reunião, foi discutida a decisão da presidência da Cnen de prorrogar a licença para funcionamento da mina de extração de urânio de Caetité, no sertão baiano. A decisão havia contrariado um laudo de fiscais da Cnen. Eles recomendaram o fechamento da instalação por não haver garantias de que o lençol freático da região não esteja sendo contaminado pelo trabalho na mina. Mesmo assim, a Comissão Deliberativa endossou a decisão da Cnen.
Na entrevista que deu ao programa Fantástico, da Rede Globo, Sarney contou que ao assumir o governo descobriu que havia instalações nucleares na serra do Cachimbo, no oeste do Pará. O ex-presidente afirmou que o assunto era “segredo de Estado”, e por isso não podia ser divulgado. Também em entrevista ao programa, José Luiz Santana, que substituiu Nazaré Alves na presidência da Cnen, afirmou que mais de 50 equipes chegaram a ser mobilizadas para fazer a bomba, artefato que teria potência equivalente às ogivas nucleares lançadas pelos Estados Unidos no Japão.
Só em 1990 foi fechado um túnel construído clandestinamente para a realização de testes nucleares na serra do Cachimbo, no oeste do Pará André Dusek/AE/4.10.90
Enquanto tentava desarticular o esquema armado para construir a bomba, nos primeiros seis meses do governo Collor, Santana sofreu três atentados. Em duas ocasiões seus inimigos mexeram em peças de seu automóvel para provocar um acidente, e em outra atiraram contra ele.
O Programa Nuclear Paralelo começou a se tornar público em 1986, quando uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo revelou a existência de cisternas e covas na serra do Cachimbo, uma delas com 320 metros de profundidade, para a realização de testes nucleares. Nas investigações do Ministério Público e do Congresso que se seguiram à denúncia, descobriu-se a existência de contas bancárias secretas que eram conhecidas dentro do Programa Nuclear Paralelo pelo nome de Delta. Rex Nazaré Alves, na época no meio de sua gestão na presidência da Cnen, foi apontado como um dos responsáveis pelas movimentações dessas contas.
Kombis com documentos
Ele foi ainda acusado de retirar sete Kombis cheias de documentos da Cnen, que poderiam detalhar o processo de construção da bomba e nunca mais foram encontrados. José Goldemberg, ex-ministro de Collor e atual secretário de Meio Ambiente do estado de São Paulo, disse em entrevista ao jornal New York Times que Rex Nazaré Alves era um dos dois principais responsáveis pelo programa secreto.
O ex-ministro Roberto Amaral diz que ao nomear Rex Nazaré Alves para a Comissão Deliberativa desconhecia o envolvimento do escolhido com as contas secretas. “Só estou sabendo disso agora”, afirmou Amaral na última segunda-feira. Alves, que também é professor do Instituto Militar de Engenharia, no Rio de Janeiro, não quer falar sobre o Programa Nuclear Paralelo nem sobre as acusações de ligação com contas secretas e roubo de documentos. “Aquilo que eu tinha que fazer, eu fiz na época em que tinha funções na Cnen”, afirma. “Havia assuntos sigilosos, e há uma lei que protege esse tipo de assunto.”

Comissão mantém conflito de interesses
Durante a gestão de Rex Nazaré Alves como presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear, foi enterrado o documento que ficou conhecido como Relatório Vargas. Nele, um grupo de especialistas convocados pelo governo federal para sugerir mudanças na política nuclear defendia que a Cnen deixasse de acumular as funções de produção e fiscalização no setor, que são conflitantes. Apesar de exigida pela Agência Internacional de Energia Atômica e por convenções internacionais das quais o Brasil é signatário, a separação que Alves ajudou a impedir não ocorreu até hoje.

A comissão criada pelo então presidente José Sarney era composta por empresários, engenheiros, economistas e outros acadêmicos. O coordenador era o cientista José Israel Vargas, que depois seria ministro dos presidentes Itamar Franco (1992-1995) e de Fernando Henrique. O relatório foi entregue a Sarney em abril de 1986. Além de não seguir a recomendação de dividir a Cnen, Sarney resolveu vinculá-la à então Casa Militar da Presidência da República. Ao se opor à idéia da comissão, Nazaré Alves argumentava que a divisão da Cnen iria gerar desperdício de esforços e recursos. Uma década depois, no governo de Fernando Henrique Cardoso, a separação voltou a ser proposta e voltou a ser barrada. A equipe montada pelo PT para fazer a transição antes da posse de Lula também discutiu o tema, mas até hoje a Cnen resiste indivisível.

O órgão é subordinado ao Ministério da Ciência e Tecnologia e cuida de instalações que vão desde aparelhos de clínicas de tratamento de câncer até as usinas de Angra 1 e Angra 2. A relação entre as funções produtivas e fiscalizatórias é tão forte que a Cnen é oficialmente proprietária da Indústrias Nucleares do Brasil (INB), que faz a exploração de urânio em Caetité, produz pastilhas de combustível para as duas usinas nucleares e está começando o processo de enriquecimento de urânio em Resende (RJ). O presidente da Cnen é também presidente do conselho de administração da INB. Na teoria, a Cnen fiscaliza uma empresa subordinada a ela. Na prática, a situação ainda é mais grave, porque a INB, com orçamento próprio e maior poder econômico, tem força de influenciar nas decisões da Cnen.
O presidente da Cnen, Odair Dias Gonçalves, que integrou o grupo responsável pela transição para o atual governo, diz que há um consenso hoje sobre a necessidade de separar as áreas de fiscalização e controle da parte de produção nuclear. Só acha que não há pressa. “Existe um risco de separar tudo de maneira intempestiva”, afirma. O adjetivo soa estranho para uma discussão que se arrasta por 20 anos. O deputado Edson Duarte (PV-BA), que coordena na Câmara uma equipe responsável por propor mudanças na política nuclear, discorda de Gonçalves e prepara um projeto de lei para separar as funções da Cnen. “A área nuclear concentra atividades nas quais não pode haver erro”, afirma. “Não é ético a Cnen se autofiscalizar.”

Fiscalização
Outro problema grave que se arrasta há décadas na Cnen é a falta de poder efetivo de coerção dos fiscais do órgão. No Ministério da Agricultura, se um fiscal acha um abatedouro sem condições de higiene, pode mandar fechar na hora e impedir que a carne podre continue saindo dali para os consumidores. No caso da Cnen, além de fiscalizar o equivalente a abatedouros próprios, os fiscais não podem mandar fechar uma instalação nuclear. Se limitam a fazer relatórios que podem ou não ser seguidos pela presidência da instituição. “A área nuclear é um sistema complexo e achamos que a autonomia de controle deve ser compartilhada”, justifica Odair Gonçalves.
O que ele chama de compartilhamento tem feito a direção da Cnen desrespeitar avaliações técnicas de seus especialistas. O caso da mina de Caetité, que os técnicos queriam fechar e a presidência da Cnen manteve aberta, não foi o primeiro. À revelia de seus fiscais, por exemplo, a Cnen autorizou a produção de pastilhas de urânio em Resende sem avaliar o risco de reação em cadeia do minério. Um risco mal avaliado pode produzir uma explosão. Nos últimos anos, a Associação dos Fiscais da Cnen, que reúne engenheiros, biólogos, físicos e outros especialistas, entregou a autoridades do governo, incluindo os presidentes Fernando Henrique e Lula, relatórios alertando para o perigo que representam à sociedade os problemas estruturais da Cnen. A entidade também preparou o esboço de um projeto de lei criando o Sistema Federal de Fiscalização, que daria poder coercitivo aos técnicos. “Resta saber até que ponto os interesses ditos como de soberania e defesa nacionais continuarão se sobrepondo aos da segurança da população”, diz o físico Rogério Gomes, presidente da associação.

Fonte: Solano Nascimento da equipe do Correio Braziliense, 20 Setembro 2005
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