Soa o alerta. Algo está errado. Mas o quê?
Marlene Galeazzi relembra que o inimigo dá início à devastação. Surge, então, uma questão: de que maneira se dá combate a algo que é invisível, insípido e inodoro?
Naquele mesmo dia, com a internação de pessoas ligadas à Rua 57 e aos depósitos de ferro-velho, inclusive Wagner Mota Pereira e sua família, em vários hospitais – entre eles o de Doenças Tropicais –, o alerta foi dado. O problema estava realmente naquela peça que acabara de ser colocada em cima de uma cadeira nas dependências da Vigilância Sanitária.
Um dos médicos, depois de testar vários diagnósticos, pede a presença de um físico para que medisse o grau da radiação. No dia seguinte, 29, os físicos Walter Mendes, da Secretaria de Saúde, e Sebastião Maia, do escritório local da Nuclebrás, confirmaram a suspeita. Eles vão ao secretário de Saúde do Estado de Goiás, Antônio Faleiros, que estava chegando de um evento em São Paulo, e relatam o fato. Faleiros vai ao governador Henrique Santillo e acompanhado de um policial militar e do físico Flamarion Goulart – exatamente o que prestava serviços para o Instituto Goiano de onde a bomba de césio estava abandonada –, constata a realidade. E imediatamente toma a frente da operação.
Às 15h, no momento em que dava entrevista a TV Anhanguera, filial da Rede Globo, sobre a questão da febre amarela, liga para o físico José Júlio Rozenthal – então presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear e morando hoje em Israel – pedindo para ele ir a Goiânia. A repórter ouve a conversa e solta uma pequena nota sobre o assunto. Mas coube a outra jornalista, Raquel Azeredo, da TV Goiás, que repetia o SBT, colocar no ar na véspera, em rede nacional, a tragédia que estava acontecendo em Goiânia.
"Ao chegar à redação, por volta das 7h, o coordenador do programa, Weber Borges, me passou uma estranha pauta, dizendo: 'Abra o olho que tem um caso sério de intoxicação na cidade e não estão sabendo tratar. Recebi um telefonema anônimo informando. Te vira, teu pai é médico'. Como meu pai estava na fazenda, procurei um médico conhecido e ele me confirmou que tinham pessoas intoxicadas – no caso, os irradiados que estavam procurando tratamento – e que eles não estavam sabendo tratar. Com minha equipe, saí correndo atrás da história até chegar no ferro-velho de Devair, que estava com sua família. Entrevistei todo mundo, vi gente perdendo o cabelo e os dentes na frente das câmeras e soube que naquele mesmo dia tinham levado o estranho aparelho para a Vigilância Sanitária. Fomos lá e continuamos as filmagens.
Sem receber explicações de ninguém, resolvi colocar no ar, às 19h, a minha versão de que uma bomba de cobalto tinha atingido algumas pessoas em Goiânia e que ninguém sabia qual o tratamento que deveria ser feito. Acredito que isto foi o que fez com que providências imediatas fossem tomadas e o assunto, ainda que timidamente, chegasse às redações dos jornais de todo o País, no dia seguinte", contou Raquel, aos repórteres do mundo inteiro, que, aos poucos, foram chegando a Goiânia.
Ela, a profissional da imprensa que esteve mais próxima dos irradiados e que ficou muito perto da bomba de césio, nunca teve problemas de saúde. Tornou-se deputada estadual e hoje, 20 anos depois, retornou à televisão no comando do programa Goiânia nas Ruas.
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