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Especial -> 65 Anos da Explosão da Bomba Atômica

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A QUESTÃO HIBAKUSHA

Nem todas as histórias de sobreviventes da bomba são uma sucessão de tragédias. Embora raras, algumas dessas pessoas têm experiências relativamente felizes para relatar, embora as tristes lembranças do que elas viveram no dia da explosão tenham alterado suas vidas para sempre.

Em 1945, Takashi Morita era um jovem soldado mais preocupado em sobreviver do que lutar. Havia se alistado pois no exército ainda havia comida - o resto da população no Japão passava fome com o racionamento. Ele estava em Tóquio em março, quando nos dias 9 e 10 os americanos bombardearam a cidade por horas e 80 mil pessoas morreram. Isso fez com que ele pedisse transferência para sua cidade natal, Hiroshima, que curiosamente se mantinha intacta, poupada dos bombardeios. Ele achou que seria mais seguro voltar para casa.

Feridos demais, poucos médicos - a sede da Cruz
Vermelha em Hiroshima e o principal hospital da
 cidade foram destruídos na explosão, e os ocupantes
 destes prédios mortos. Cada médico e cada enfermeira
 sobrevivente atendeu centenas de pacientes sem
dispor de infra-estrutura mínima.
Foto: Hiroshima Peace Memorial Museum.
Após meses de espera, Morita finalmente conseguiu sua requisitada transferência - ele chegou à cidade apenas poucos dias antes do fatídico 6 de agosto. No dia da explosão, ele estava num bonde, com alguns outros soldados a caminho do quartel. Ele havia acabado de descer do bonde, quando sentiu o vento levantá-lo pelo ar e arremessá-lo ao chão a quase cem metros de onde estava. Ele ficou atordoado por alguns instantes, e se recorda de um súbito calor calcinante. Ao olhar para trás, à procura de seus colegas, viu que eles não haviam tido sorte. O bonde do qual havia acabado de sair estava em chamas, e ele achou que o veículo havia explodido. Mas bastou ele olhar ao redor para perceber que algo muito maior havia ocorrido. Havia muita gente ferida e a destruição era grande demais para uma bomba comum. Ele tentou socorrer um menino muito queimado, cujas últimas palavras foram "senhor soldado, por favor, vingue a minha morte". Infelizmente aqueles eram tempos de guerra, e Morita ainda fica com os olhos cheios de lágrimas ao se recordar do desconhecido garoto. Mesmo sentindo dor nas costas e nuca (mais tarde Morita descobriu que eram queimaduras da explosão atômica), ele se dirigiu ao centro da cidade para ajudar no socorro à população. As cenas de terror daquele dia, mais de 60 anos depois, ainda lhe causam pesadelos. Ele se lembra de ter sentido uma sede anormal e repentinamente desmaiar, vindo a acordar dias depois num hospital de campanha.

Tendo sido exposto à radiação, Morita adoeceu seriamente, perdeu os cabelos, mas diferentemente de muitos sobreviveu. Nos anos 50 decidiu tentar reconstruir a vida no Brasil. Estabeleceu-se em São Paulo, onde trabalhou como ourives e joalheiro. Aposentou-se mas não parou de trabalhar, e abriu duas mercearias especializadas em comida japonesa e um restaurante. Morita casou-se com uma sobrevivente de Hiroshima; teve dois filhos e vários netos. Como todo hibakusha, Morita sempre se preocupa com a própria saúde e a de seus descendentes, e afirma aliviado que todos são saudáveis.

Hoje octagenário, Morita-san é um caso à parte. Lúcido, ativo e bem-humorado, ele costuma dizer que "eu passei por dois dos piores bombardeios da 2ª Guerra no Japão. Não sei se isso é sorte ou azar. Se eu sobrevivi, é porque realmente não era para eu morrer cedo". Ele é certamente afortunado, mas isso não quer dizer que Morita, assim como todos os hibakusha - nome pelo qual são conhecidos os sobreviventes das explosões atômicas em Hiroshima e Nagasaki - não tenham tido difíceis dias seguintes após a bomba.

Queimadura radioativa "grave" - esta senhora teve parte
 do rosto, a nuca, as costas e o braço direito queimados
 pela radiação. Os raios atravessaram as áreas tingidas
 em tons escuros do quimono que ela usava no momento
 da explosão, "imprimindo" na pele os desenhos do
 tecido. Foto: Hiroshima Peace Memorial Museum
Diferentemente do que hoje se imagina, as vítimas da bomba atômica não dispuseram de imediato da simpatia ou da compaixão pública. As explosões causaram problemas inéditos na história da humanidade, no campo da política, das relações internacionais, até de ordem social. As seqüelas permanentes das queimaduras radioativas - as quelóides - desfiguraram muitos dos sobreviventes a ponto de serem impedidos de terem uma vida social comum. A exposição à radiação criou um medo generalizado de que descendentes dos sobreviventes viessem inexoravelmente a desenvolver doenças como o câncer e problemas físicos de má formação congênita. A condição de hibakusha levavam muitos a se opor a um casamento e por isso durante décadas os sobreviventes ou tiveram de ocultar o fato, ou se casaram com outro(a) sobrevivente. Em qualquer lugar e cultura, desinformação gera medo, e o medo gera preconceito. Por décadas, principalmente nos Estados Unidos, evitou-se divulgar o que de fato havia ocorrido com as pessoas que estavam em Hiroshima e Nagasaki. O mundo estava ideologicamente dividido pela Guerra Fria, e o governo americano não queria que sentimentos de culpa gerassem movimentos pacifistas que dividissem a opinião pública. Mesmo no Japão - transformado no pós-guerra em país aliado dos Estados Unidos em função de sua posição estratégica no tabuleiro de interesses da Guerra Fria - procurou-se manter a questão hibakushafora da mídia. Era mais importante mostrar as cidades reconstruídas do que falar sobre as cicatrizes físicas e psicológicas dos sobreviventes.

Os ferimentos e as doenças atípicas causadas pela radiação criaram um desafio para a medicina. Não havia nem conhecimento nem experiência para o tratamento eficaz das vítimas. Logo após a explosão até ossos esmagados dos mortos nas explosões foram usados pelos sobreviventes como medicamentos - o que indica o grau de desabastecimento de remédios e curativos básicos, e o desespero das pessoas na época. A experiência ao longo de décadas tratando dos sobreviventes da bomba, por outro lado, fez com que o Japão desenvolvesse o que hoje é um avançado know-how no tratamento de doenças da radiação. Esse tratamento especializado é prestado gratuitamente aos hibakusha no Japão. Entretanto, tal regra não se aplica aos sobreviventes que emigraram para outros países, como os imigrantes japoneses que vieram para o Brasil. É para estender tal benefício aos hibakusha que vivem no Brasil que Takashi Morita fundou aqui uma associação: a Associação das Vítimas da Bomba Atômica. "Não se trata de um favor ou algo excepcional" - explica Morita - "É um direito que os sobreviventes têm, e é um tratamento que só existe no Japão. Já é difícil para cada hibakusha ter que ir até o Japão, e custear a viagem e a estadia do próprio bolso. Pagar despesas médicas particulares lá é algo impossível".

Fonte: http://www.culturajaponesa.com.br/htm/bombaatomica.html

Comments (2)

É importante que o homem nunca se esqueça da brutal covardia que aconteceu as 08:15h do dia 06/08/1945. Aonde o domínio e a sede pelo poder dominaram o coração dos homens destruindo a história de milhares e milhões de pessoas.
Deus faça justiça,
Paz na Terra!

Eu tenho fobia de bombas atômicas! Espero que eu nunca presencie uma cena como essa!

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