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Foco errado na questão nuclear

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São preocupantes os interesses de fundo que movem as potências no novo debate sobre desarmamento nuclear. Depois de quase 20 anos do fim da Guerra Fria, Estados Unidos e Rússia firmaram na quinta-feira histórico acordo em que se comprometem a reduzir em um terço os respectivos arsenais. A celebração de tal gesto, contudo, parece exagerada. Há mérito inegável na continuidade do processo de reaproximação diplomática entre duas nações que por mais de quatro décadas impuseram ao mundo, com seu antagonismo exacerbado, o terror da ameaça de uma explosão atômica. A partir daí, é de se questionar até onde é exequível o compromisso assumido. E ainda que o fosse, sua seriedade não resistiria a batida piada: a de que sobrariam ogivas suficientes para cada qual destruir o planeta algumas vezes. 


Não é tudo. Preocupa especialmente perceber a paz excluída do debate. Detentores de aproximadamente 90% do estoque mundial, EUA e Rússia não discutem a eliminação dos estoques e a renúncia ao uso de armas atômicas. Tampouco será essa a pauta da Cúpula sobre Segurança Nuclear que a administração Obama realizará esta semana em Washington nem a da Conferência de Revisão do Tratado de Não Proliferação (TNP), em maio, na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York. O que há é um rearranjo de forças. Superada a disputa capitalismo x comunismo, o Kremlin e a Casa Branca agora se põem do mesmo lado, contra um inimigo comum: o fundamentalismo islâmico. Trata-se, pois, de nova aliança para nova espécie de guerra fria em que prevalece o principal: a pior das bombas como poder dissuassório. 

O impacto do horror que se abateu sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, atacadas com bombas atômicas pelos Estados Unidos em agosto de 1945, teve força suficiente para acabar com a Segunda Guerra Mundial. Mas não conseguiu convencer o mundo a pôr fim imediato a esse tipo de armamento. Apenas 72 horas depois da imoral crueldade da carbonização imediata de 25 mil pessoas no ato de lançamento da primeira, a cena se repetia. Juntas, as duas explosões respondem por mais de três centenas de milhares de mortos. Ali, a humanidade foi condenada a um eterno pesadelo. Espanta que caiba logo a Barack Obama, eleito sob o signo da paz, reinaugurar a era do medo. Afinal, em que difere das anteriores, a doutrina nuclear recém-anunciada por Washington, uma vez que o princípio é restringir o uso de armas atômicas a “circunstâncias extremas”? Seria plausível imaginar a aplicação do armamento em outra ocasião? 

A história tem reiteradas vezes demonstrado a urgente necessidade de se reformular as Nações Unidas, dominadas pelo clube atômico e seu poder de veto no Conselho de Segurança. Tivesse a ONU suficiente independência, respeito mundial e força, a questão nuclear teria encaminhamento diferente. Mas, enquanto esse debate for conduzido pelos países que têm a bomba, a concessão máxima será a redução do arsenal, nunca a eliminação. Mais grave é que nem a não proliferação tem sido bem-sucedida. Estão aí os exemplos da Índia, do Paquistão, de Israel, da Coreia do Norte e agora das suspeitas sobre o Irã.


Mais riscos, menos proteção

É enorme a carência de especialistas em segurança nuclear

Cientistas de vários países estão tratando de aproveitar a Conferência sobre Segurança 
Nuclear, em Washington, para pressionar os Estados que desenvolvem programas nessa área a dar prioridade à educaçãoO motivo é preocupante: a cada ano são formadas no máximo 40 pessoas habilitadas a zelar por tal segurança.

Em todo o mundo há apenas quatro universidades que oferecem o curso de segurança 
nuclearDuas nos Estados Unidos (Texas A&M University e Universidade de Missouri) e duas na Rússia (Instituto de Engenharia Física de Moscou e Universidade Politécnica Tomsk). Elena Sokova, diretora assistente do Centro para Estudos de Não Proliferação James Martin, em Monterey, na Califórnia, é uma das vozes mais incisivas do grupo que critica a falta de atenção à área: — Acho que além de haver um investimento nesse tipo de educação, por parte dos países que têm programa civil de energia nuclear e da própria Agência Internacional de Energia Atômica, a indústria nuclear deve investir mais vigorosamente na educação e treinamento de especialistas em segurança nuclear. Estamos muito atrás, ainda, em termos de progresso nessa área — disse Sokova.

Os Estados Unidos deram um passo adiante semanas atrás, quando o presidente Barack Obama assinou uma lei que cria incentivos na forma de estágios, bolsas de estudos e prêmios para professores e estudantes universitários que sigam a carreira 
nuclear.

— Este mês completam-se 24 anos do acidente em Chernobyl, que resultou no estabelecimento de padrões internacionais de segurança. Mas não podemos esperar mais um quarto de século para que cada especialista nas áreas de energia, medicina e pesquisa 
nuclear aprenda técnicas de segurança — concluiu Sokova.


Fonte: Correio Braziliense - 12/04/2010
Foto - ultimosegundo.ig.com.br
O Globo - 13/04/2010

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