Todos sabemos que a questão dos
resíduos radioativos são um problema paralelo que igual relevância. O
continente da África é também um conhecido deposito de lixo radioativo. O único
depósito que se diz definitivo no mundo fica em Abadia de Goiás – GO no Brasil.
Há uma preocupação grande com o trafico
internacional de material radioativo e as chamadas bombas sujas. O Brasil já
foi manchete de jornal exportando ilegalmente pelo norte material radioativo
para o Iraque. As bombas sujas são artefatos bélicos recheados de material
radioativo. O artefato não ganha a potencia atômica, mas serve como poderosa
arma biológica.
Como podemos crer que uma indústria que
não controla os resíduos que produz poderia ser a indústria do futuro? É como
um prédio que é construído a partir da cobertura.
“RESÍDUO
De
tudo ficou um pouco.
Do
meu medo. Do teu asco.
Dos
gritos gagos. Da rosa
ficou
um pouco.
Ficou
um pouco de luz
captada
no chapéu.
Nos
olhos do rufião
de
ternura ficou um pouco
(muito
pouco).
pouco
ficou deste pó
de
que teu branco sapato
se
cobriu. Ficaram poucas
roupas,
poucos véus rotos
pouco,
pouco, muito pouco.
Mas
de tudo fica um pouco.
Da
ponte bombardeada,
de
duas folhas de grama,
do
maço
—
vazio — de cigarros, ficou um pouco.
Pois
de tudo fica um pouco.
Fica
um pouco de teu queixo
no
queixo de tua filha.
De
teu áspero silêncio
um
pouco ficou, um pouco
nos
muros zangados,
nas
folhas, mudas, que sobem.
Ficou
um pouco de tudo
no
pires de porcelana,
dragão
partido, flor branca,
ficou
um pouco
de
ruga na vossa testa,
retrato.
Se
de tudo fica um pouco,
mas
por que não ficaria
um
pouco de mim? no trem
que
leva ao norte, no barco,
nos
anúncios de jornal,
um
pouco de mim em Londres,
um
pouco de mim algures?
na
consoante?
no
poço?
Um
pouco fica oscilando
na
embocadura dos rios
e
os peixes não o evitam,
um
pouco: não está nos livros.
De
tudo fica um pouco.
Não
muito: de uma torneira
pinga
esta gota absurda,
meio
sal e meio álcool,
salta
esta perna de rã,
este
vidro de relógio
partido
em mil esperanças,
este
pescoço de cisne,
este
segredo infantil...
De
tudo ficou um pouco:
de
mim; de ti; de Abelardo.
Cabelo
na minha manga,
de
tudo ficou um pouco;
vento
nas orelhas minhas,
simplório
arroto, gemido
de
víscera inconformada,
e
minúsculos artefatos:
campânula,
alvéolo, cápsula
de
revólver... de aspirina.
De
tudo ficou um pouco.
E
de tudo fica um pouco.
Oh
abre os vidros de loção
e
abafa
o
insuportável mau cheiro da memória.
Mas
de tudo, terrível, fica um pouco,
e
sob as ondas ritmadas
e
sob as nuvens e os ventos
e
sob as pontes e sob os túneis
e
sob as labaredas e sob o sarcasmo
e
sob a gosma e sob o vômito
e
sob o soluço, o cárcere, o esquecido
e
sob os espetáculos e sob a morte de escarlate
e
sob as bibliotecas, os asilos, as igrejas triunfantes
e
sob tu mesmo e sob teus pés já duros
e
sob os gonzos da família e da classe,
fica
sempre um pouco de tudo.
Às
vezes um botão. Às vezes um rato.”
Carlos Drummond de
Andade
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